Por trás da cortina de fumaça, o povo em luta resiste! Carta das organizações que vivem e lutam na Amazônia!
Nós dirigentes sindicais, representantes dos trabalhadores rurais agricultores e agricultoras familiares, organizados por meio dos 369 Sindicatos de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais e 07 federações da região Norte, filiados ao Sistema Confederativo CONTAG e à CUT, e diversas organizações parceiras abaixo subscritas, vimos a público denunciar o que realmente tem causado as grandes queimadas na Amazônia e os impactos gerados na vida das populações que aqui vivem.
A Amazônia têm vivido um processo de ocupação desenfreada ao longo dos anos, impulsionada pela ganância de grandes empreendimentos que, em nome de um dito “desenvolvimento”, ameaça os territórios comunitários face à flexibilização das ações de comando-controle, pressão sob áreas protegidas, expansão da fronteira agropecuária e de grandes projetos de infraestrutura como portos, ferrovias, calagem de rios para dar condições de transitar grandes embarcações, ação de grandes mineradoras, dentre outras. Estas sim são as verdadeiras causas da cortina de fumaça que cobre a Amazônia, resultando em um aumento considerável do desmatamento na região.
Nós, agricultores e agricultoras familiares, cuja face amazônida é representada por camponeses, extratitivistas, pescadores, indígenas e quilombolas, populações tradicionais temos ao longo dos anos buscado estabelecer uma relação de convivência entre a necessidade de produzir e garantir geração de renda e vida digna a quem vive neste tão cobiçado bioma, e a necessidade de respeito e preservação das riquezas naturais, como um bem nosso e patrimônio das futuras gerações. No entanto, historicamente, as vozes dos povos que ecoam da Amazônia, têm dificuldade de ser ouvidas, ganhando força o apoio apenas a projetos que contribuem na pressão sobre as áreas preservadas como unidades de conservação, terras indígenas, destruindo o direito soberano de nossos povos de efetivamente decidirem sob o desenvolvimento em seus territórios, arcando apenas com o ônus que tem sido deixado, com a expulsão das populações de suas terras.
Temos acompanhando com crescente preocupação a forma como o Fundo Amazônia vem sendo tratado junto ao Ministério de Meio Ambiente. Sem uma política clara de reforço e ampliação das ações exitosas e impactos positivos dos projetos apoiados pelo fundo, aliada a questionamentos recorrentes sobre a eficiência e seriedade no uso dos recursos destinados aos projetos financiados pelo Fundo Amazônia, fica evidente a ausência de vontade política em ações na Amazônia que sejam, de fato, sustentáveis econômica, social e ambientalmente. Defendemos a continuidade do Fundo Amazônia, uma vez que seus recursos são essenciais para o combate ao desmatamento e à conservação ambiental na Amazônia, incidem no combate a práticas ilegais de exploração dos recursos naturais e, fundamentalmente, colabora para a garantia de um desenvolvimento sustentável para a Amazônia e suas populações.
Por trás da cortina de fumaça é possível visualizar a desgovernança causada pela fragilidade da regularização fundiária na Amazônia. Voltamos à estaca zero com o fim do Programa Terra Legal, cujo esforço vinha sendo de reconhecer a ocupação, em especial de agricultores e agricultoras familiares, que há vários anos vivem em áreas que, em sua grande maioria, são terras públicas da união, passíveis de regularização por programas de reforma agrária. A ausência de documentação impede o acesso dos agricultores a diversas outras políticas que possam garantir aumento de renda e produção, como acesso a tecnologias, o que poderia contribuir para diminuir a pressão sob novas áreas.
A expansão do agronegócio que atenda a demanda de grandes commodities, além de contribuírem para o desmatamento de grandes áreas, tem arrendado terras para ampliação do processo produtivo demandado pelo mercado mundial, levando a um grande desalojamento das comunidades locais, a partir da impossibilidade de convivência, em seus territórios, com a pulverização aérea, além do crescente e indiscriminado uso de agrotóxicos, deixando um rastro visível de contaminação no ar que respiramos, em nossas águas, na destruição de nossa biodiversidade e, mais seriamente, na saúde dos que aqui vivem. Nos assusta imaginar que futuro nos reserva os impactos gerados pela liberação de mais de 290 novos tipos de agrotóxicos, apenas no primeiro semestre no Brasil? Que desenvolvimento é este que está sendo impulsionado? A quem interessa? As conseqüências são apenas na vida das populações que vivem no meio rural? Ou a todos que dependem dos alimentos aqui produzidos?
Por trás desta cortina de fumaça, fica ainda a marca do sangue dos que têm perdido suas vidas em defesa de seus territórios. Segundo dados do Caderno de conflitos no campo, publicado pela Comissão pastoral da Terra, só em 2018 foram registrados 1.489 conflitos, envolvendo mais de 1 milhão de pessoas, dado que registra um aumento de 36% em relação a 2017, sendo que 86% dos assassinatos por conflitos no campo, ocorreram na Amazônia. Tememos ainda pelos resultados que podem trazer o cumprimento das inúmeras decisões de ordens de despejo que vêm sendo decretadas, em terras públicas da união, que estão sendo desobstruídas, desocupadas, em detrimento do interesse de alguns, e em contraponto do desalojamento de inúmeras famílias.
Nós organizações de luta da Amazônia, queremos também nos solidarizar com o difícil momento enfrentado pelos imigrantes venezuelanos e nos somarmos à tarefa de acolhida a todos. Além disso, manifestar nossa indignação contra processos de exploração, ora crescentes, onde pessoas sem nenhum senso de humanidade, tem se aproveitado da situação para ampliar o processo de precarização do trabalho a que tem sido submetido estas famílias.
Conclamamos ao povo brasileiro e também a comunidade internacional que se solidarizem com a atual situação vivida na Amazônia a se somarem as mulheres e homens, que através das diversas lutas, como a marcha das margaridas, os gritos da terra, os chamados da floresta e tantas outras manifestações, a exemplo da mobilização ora realizada pelo Sínodo da Amazônia, fortalecendo as vozes dos que aqui resistem, para que possamos juntos fortalecer um “levante popular na Amazônia”, capaz de garantir a efetivação de um projeto de alternativo desenvolvimento rural sustentável e solidário, que possa estar fundado em bases estruturantes como a terra, água, e agroecologia, bem como na defesa do bem viver e respeito as populações amazônidas e que, acima de tudo, considere a autonomia e soberania dos povos que aqui vivem.
Subscrevem a carta:
Federação dos Trabalhadores na Agricultura do estado do Amapá - FETAGRAP
Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do Amazonas - FETAGRI-AM
Federação dos Trabalhadores na Agricultura do estado do Acre - FETACRE
Federação dos Trabalhadores na Agricultura do estado do Pará - FETAGRI-PA
Federação dos Trabalhadores na Agricultura do estado de Roraima - FETRAFER
Federação dos Trabalhadores na Agricultura do estado de Rondônia - FETAGRO
Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Tocantins - FETAET
CONTAG – Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais na Agricultura Familiar
CUT- Central Única dos trabalhadores
CNS - Conselho Nacional das populações extrativistas
FASE- Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional
Rede Agroecológica do Maranhão
Comitê Chico Mendes
APA-TO- Articulação Tocantinense de Agroecologia
Associação Agroecológica Tijupá
ANA Amazônia- Articulação Nacional de Agroecologia da Amazônia
Associação Comunitária de educação em saúde e agricultura- ACESA
Coordenação Estadual das comunidades quilombolas do Tocantins - COEQTO
Instituto Padre Ezequiel Ramim.
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